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sexta-feira, 19 de junho de 2009

PALAVRAS DO do bisneto do Presidente "Affonso Penna" - Affonso Augusto Moreira Penna




PALAVRAS DO do bisneto do Presidente "Affonso Penna" - Affonso Augusto Moreira Penna



14/06/2009 – Centenário de falecimento do Presidente do Brasil AFFONSO PENNA – Pronunciamento do seu bisneto Affonso Augusto Moreira Penna, à beira do mausoléu que guarda seus restos mortais, no pátio interno do Memorial Affonso Penna – Santa Bárbara / MG

Permitam-me os caros parentes e amigos aqui presentes que me dirija ao Presidente Affonso Penna, à beira do seu mausoléu. Faço-o desta forma pois ele e suas lições de vida estão vivos em minha mente.

Meu querido bisavô,
Quanta responsabilidade em lhe falar em nome da família ! Faço minhas as palavras de meu avô – Affonso Penna Junior – ao se referir ao senhor, em discurso de paraninfo da turma de 1920 da Faculdade de Direito em Belo Horizonte (hoje UFMG):
“Daquele a quem a bondade de seus pares tem conferido as honras de fundador desta Casa, daquele cujo nome sem mancha eu tenho a difícil honra de trazer sem deslustre...”.

Meu caro bisavô,
O senhor pronunciou, antes de cerrar os olhos, ao ouvido do ilustre médico Dr. Miguel Couto: DEUS, PÁTRIA, FAMÍLIA E LIBERDADE.
Suas palavras representam uma admirável síntese da sua vida. Cito apenas algumas, dentre múltiplas demonstrações dos seus magnos princípios.

Em primeiro lugar o senhor falou em DEUS. Além da formação religiosa, propiciada em casa pelo exemplo de seus pais, o senhor cursou o ensino fundamental no admirável Colégio do Santuário do Caraça, sob as graças da N.Sra. Mãe dos Homens.
Em 1894 o senhor, na qualidade de Presidente (hoje Governador) do estado de Minas Gerais, disse em sua última mensagem ao Congresso mineiro: “Quando em outros estados da República as paixões políticas, ladeadas de ambições desmarcadas, agitam a sua vida pública, fazendo explosões violentas que se traduzem na luta armada, Minas entrega-se ao trabalho, à exploração regular dos elementos naturais de riqueza de que é dotado, gozando de paz e tranqüilidade, pelo que devemos render graças ao Todo Poderoso. Sim, é no sentimento religioso do povo mineiro, nas suas tradições democráticas, nos seus hábitos inveterados de ordem, de amor à liberdade e de respeito à lei que encontramos a explicação da sua felicidade, no meio das agitações que têm conturbado a vida pública em grande número de estados da República.”

Em 1895, após declinar, por motivos familiares, de convites para vários cargos no governo do Presidente Prudente de Morais, o senhor escreveu para David Campista: “ O Dr. Prudente voltou à carga convidando-me para presidente do Banco da República (atual Banco do Brasil). Pedi-lhe que me escusasse e que eu não recusava peremptoriamente por me sentir vexado de não poder até agora atendê-lo em seus honrosos convites. Já se exploravam minhas recusas em detrimento do governo e até atribuiu-se-me o propósito de reservar-me para mais altos destinos! Como se eu fosse ambicioso e de mais a mais inepto, mostrando desconhecer as terríveis dificuldades que assoberbam o lugar de Presidente da República. Entendi, pois, dar público testemunho de apoio ao governo e vou entrar para uma casa de marimbondos. É o menos que espero lá encontrar; mas Deus há de permitir que eu cumpra meus deveres com a honestidade de costume. Nestes 15 dias irei para o Rio...
O senhor, mesmo no exercício da Suprema Magistratura da Nação, ia todas as quintas-feiras à casa dos padres lazaristas, seus antigos mestres no Caraça, em Botafogo / Rio de Janeiro, para confessar-se. Nunca faltava às missas dos domingos. Como disse o Professor e Acadêmico Américo Jacobina Lacombe: “Foi o primeiro presidente que praticou publicamente sua fé.”

A seguir o senhor falou na PÁTRIA.
No sentido mais amplo de pátria, ela engloba a nação, seu estado e cidade natal. E o senhor sempre demonstrou seu nobre sentimento de patriota, mineiro e santa-barbarense.

No mesmo dia em que o senhor foi empossado pelo Congresso Nacional, presidido pelo ínclito Ruy Barbosa, ou seja, em 15 de novembro de 1906, escreveu de próprio punho um telegrama para a Câmara Municipal de Santa Bárbara, dizendo: Ao assumir a Suprema Magistratura da República sinto necessidade de enviar ao modesto, laborioso e honrado povo do Município de Santa Bárbara, que me prestou sempre carinhoso e dedicado apoio na vida pública, afetuosas saudações, relembrando com saudade os dias felizes que passei na boa terra de meu berço.”
Quando o senhor precisou fazer um tratamento com as águas medicinais das fontes mineiras, escreveu, em Lambari, uma carta familiar dizendo: “Em uma laranjeira cantava suave e saudoso o sabiá. Parei para ouvi-lo e meu pensamento voou para minha casa em Santa Bárbara, onde sob o ar balsâmico da flor da laranjeira ouvi tantas vezes, junto dos meus, o canto triste do rouxinol brasileiro. Que saudades tenho desses belos tempos ! Não conhece a felicidade quem não bebeu o ar dos campos e só tem vivido a vida agitada e tumultuosa das grandes cidades. Nesses centros falta-me o ar, sinto-me asfixiado.”


Meu caro bisavô,

Após ler suas palavras pedi à Prefeitura de Santa Bárbara, e esta prontamente aquiesceu, para plantar uma laranjeira em local próximo de seu mausoléu. Estou certo de que os sabiás virão homenagear seu mestre passarinheiro !

Em 5 de julho de1890 o senhor, antigo Ministro e Conselheiro do Império, ao ser comunicado de que faria parte da chapa para Senadores da Constituinte mineira, assim se expressou: “Desde que ninguém cogita, nem pode razoavelmente cogitar de restauração monárquica, o que cumpre é organizar uma lista de nomes dignos de representarem o nosso Estado, o mais importante da União, com brilho e proveito para a causa pública, sem atender a procedências partidárias.”


E o senhor foi o relator e líder da Constituição mineira. Naquela oportunidade o senhor disse: “Pessoalmente eu desejaria ver acabado o meu mandato no dia em que fosse promulgada a Constituição. Saindo do Senado, entraria em minha casa onde iria cumprir outros deveres. Mas acima desta aspiração de descanso, eu coloco os interesses do grande estado de Minas Gerais.”
Em 30 de maio de 1892 o senhor foi eleito, praticamente por unanimidade, e empossado em 14 de julho do mesmo ano, no cargo de presidente do estado de Minas Gerais, sucedendo a Cesário Alvim. Era então presidente da República o Marechal Floriano Peixoto. Este estava rodeado de jacobinos que não aceitavam o fato do estado de Minas ser presidido por um político eleito. Queriam, a exemplo de outras unidades da Federação, que fosse nomeado um delegado do Governo central. O senhor, com a tradicional habilidade mineira, evitou o golpe contra a democracia. O Coronel Teles, comandante do Batalhão 31 em Minas, que conspirava contra seu governo, foi removido para Bagé. Em fevereiro de 1893 estourou a rebelião dos federalistas do Rio Grande do Sul, que agindo contra o governo federal, queriam penetrar em Santa Catarina e no Paraná, atingindo São Paulo. Em abril do mesmo ano o senhor, em defesa da Pátria, manifestou a posição mineira antagônica aos movimentos contra a estrutura da ordem. Em setembro rompeu a Revolta da Armada com posição monarquista. O governo central decretou o estado de sítio. O senhor evitou que Minas Gerais fosse atingida. O estado acolheu os perseguidos políticos. O senhor, em nome da ordem, se colocou ao lado do Marechal Floriano Peixoto. Criticou o militarismo pretendido por maus componentes do Exército ou da Armada que se julgavam árbitros da Nação. Em magistral manifesto aos seus coestaduanos o senhor disse: Sabem todos que não aplaudi, e, antes, lamentei a revolução de 1889, que destruiu a Monarquia, então representada pelo grande patriota D.Pedro II, homem de grande saber e serviços. Previ as agitações que seguir-se-iam a esse fato e nada do que contemplo, com profundo pesar, em nosso país, surpreende-me. Compreendi, porém, desde logo, que a Monarquia não poderia mais ser restaurada em condições de dar-nos paz, ordem e encaminhar o país a seu engrandecimento. Estava quebrado de vez o seu prestígio e os elementos novos que vieram tomar o seu lugar jamais se deixarão eliminar em país americano no fim do século XIX. Em tais condições, a restauração teria como consequência fatal o esfacelamento da grande Pátria brasileira, desastre que todo patriota deve evitar com o maior esforço....”
Em uma de suas cartas ao Marechal Floriano Peixoto, durante a tormenta, o senhor escreveu: “...Não serei eu, por certo, quem concorra para a prática de atos que possam produzir abalo fundo em nossa Pátria...”
Em decorrência de seus atos patrióticos o Marechal Floriano Peixoto lhe concedeu o título honorífico de General de Brigada. Sua bela farda branca, com as ombreiras originais e sua espada, foram doadas em 1928 por seu filho Affonso Penna Junior ao acervo do Museu Mariano Procópio, localizado em Juiz de Fora. Tive a honra de vê-las em visita recente que fiz.
Ao passar o governo de Minas Gerais ao seu sucessor – Dr. Bias Fortes – o senhor entregou-lhe um documento em que disse: “... Desejo-lhe todas as felicidades e que, ainda uma vez, preste ao nosso Estado os serviços do seu patriotismo, ilustrando cada vez mais seu honrado nome. Da minha parte tenho a consciência de haver empregado os esforços de que sou capaz, para zelar e defender os interesses de Minas durante os dois anos de governo atribulado e afanoso, que me couberam....”


Nas suas palavras finais o senhor, em seguida, falou FAMÍLIA. Ao longo de sua vida o senhor praticou as diversas facetas do amor familiar, característica marcante do povo mineiro: o amor aos pais, o amor à esposa e o amor aos filhos. No caderno de anotações iniciado por seu pai – Domingos José Teixeira Penna – em que ele mencionava os eventos familiares (casamentos, nascimentos, batizados, falecimentos), o senhor registrou de próprio punho: “Às duas horas da madrugada do dia 30 de junho de 1859 (comentar: Affonso Penna tinha apenas 11 anos e meio) , faleceu meu pai, deixando ainda menores todos os filhos do 2º matrimônio. Minha mãe tratou de educá-los, e mostrou um criterioso tino e coragem pouco vulgares no seu seio. Só eu segui a carreira literária, e já me havia destinado na Faculdade de São Paulo quando faleceu minha mãe. Este triste acontecimento teve lugar às 10 horas e um quarto da noite de 7 de julho de 1872 na cidade de Mariana. Minha mãe foi sepultada na Igreja de São Francisco em meio das sepulturas da Capela mor no lado direito. Foi uma perda que profundamente impressionou-me.”
Após sua eleição e antes de ser empossado na presidência da República o senhor fez longa viagem pelo país, para conhecer e discutir soluções dos problemas nas diversas regiões do país. De 16 de maio a 27 de agosto de 1906 o senhor percorreu 16.112 km por mar, rios e lagoas; 5.347 km em estradas de ferro, num total de 21.459 km. No mesmo dia da sua partida do porto do Rio de Janeiro, o senhor escrevia para sua esposa: “Querida Mariquinhas...Na imensidade dos mares meu coração, o meu pensamento estarão sempre junto da adorada companheira, da dedicada amiga e virtuosa esposa que tem feito a felicidade da minha vida. A tua inesgotável bondade me perdoará fazer-te sofrer, ausentando-me por tanto tempo ...Vou tranquilo pois sei que tuas orações e dos amados filhos me acompanharão por toda parte....Confio que o Cuquinho e as duas colegiais terão mitigado, com suas atenções e meiguices, a falta que sentes do Negrão e que os netinhos a ajudem nesse mister. O Tavo sempre bonzinho e amoroso vem ver-me todos os dias, no que é imitado pelo Dão. O Álvaro vai bem e muito me tem ajudado em responder cartas, telegramas, receber visitas etc. Deves ter tido notícias minhas telegráficas todos os dias, por intermédio do Edmundo. Ceição passa bem ? Abençôo os filhos e netos e envio-te um apertado e saudoso abraço. Teu, sempre teu, Negrão.”
Em outra carta, quando percorria o Amazonas, a bordo do vapor “Maranhão”, o senhor escreveu: “...Só, no meu gabinete, o espírito atravessa os mares e vai para Belo Horizonte ou Santa Bárbara, à procura dos entes queridos que lá estão. Os olhos enchem-se de lágrimas e os lábios murmuram uma prece para que DEUS proteja a minha querida gente, Que saudades !

Durante todo o tempo de sua longa viagem o senhor escreveu constantemente para sua querida esposa Mariquinhas. Nas cartas e telegramas sempre expressou seu acendrado amor por ela e por seus filhos.

Exercendo o cargo de Presidente da República o senhor continuou a manter frequente correspondência com seus manos e demais parentes que residiam em Santa Bárbara e cercanias.


Meu caro bisavô,
Sua palavra derradeira, em seu leito de morte, foi LIBERDADE.
Como nos contou a escritora Joana D´Arc Torres de Assis em seu artigo – “Quando alguém se torna grande” – “D. Regina, sobrinha neta de Affonso Penna, nascida no final do século XIX em São Gonçalo do Rio Abaixo (área que pertencia a Santa Bárbara), e lá criada, contava o caso, e era desses que sempre circulam em família. É o seguinte: - quando Affonso Penna chegou à pré-adolescência, seu pai, Domingos José Teixeira Penna, comerciante e também dono de mineração de ouro em Santa Bárbara, chamou o filho para aprender o ofício de minerar. Levou-o para a beirada do rio, onde os escravos bateavam, e foi lhe passando as primeiras lições. Depois, disse ao filho que ia resolver um negócio numa fazenda lá perto e que ele fiscalizasse o serviço até seu retorno. O menino passou a observar com maior atenção os escravos, que bateavam no rio com água até a canela. Entre eles, notou uma mulher que inclinava o corpo com grande dificuldade para tirar o cascalho do leito do rio. Ela era nova; tanta dificuldade era por quê? Olhou mais e entendeu: a escrava estava em adiantado estado de gestação. Imediatamente, chamou-a e mandou que fosse para casa e ficasse sem batear enquanto durasse o período de sua gravidez. O feitor, claro, discordou. A ordem do pirralho era um disparate. Todas as escravas sempre trabalharam estando grávidas. Obrigação de escravo nunca fazer corpo mole. E, contrariando o filho do patrão, ordenou que a gestante voltasse à bateia. Affonso Penna não se deu por vencido. Engrossando a voz, exigiu ser obedecido. Afinal, seu pai lhe dera poder para aquilo quando o deixou em seu lugar. Foi tão firme que o feitor se curvou. Ao regressar, Domingos Penna não apenas acatou a decisão do filho, mas estendeu tal direito a todas as escravas de sua propriedade que estivessem naquela mesma condição.”

Ainda no tempo do Império, no Rio Grande do Sul, um jornal publicou a notícia – “reuniram-se oficiais e alunos da Escola Militar e foram a palácio pedir a demissão de um professor da Escola Normal, que era redator de uma gazeta alemã.” O presidente do estado, que era o Marechal Deodoro da Fonseca, demitiu o professor. Em 30 de setembro de 1886, como deputado do Partido Liberal, o senhor falou na Câmara: “Isto é muito grave, Sr. Presidente. Se a força armada, se a oficialidade do exército e os soldados, sentindo-se ofendidos por uma publicação na imprensa, reúnem-se e vão perante o comandante das armas, presidente da província, exigir reparação, exigir a demissão de um empregado público, qual é a garantia que nos resta?”
Em 1887, no Parlamento Imperial, o senhor apresentou e defendeu acirradamente um projeto extinguindo os castigos corporais na Armada, tal como já ocorrera no Exército em 1874 e para os escravos em 1886. Na defesa de seu projeto o senhor disse “ser um absurdo que tais castigos permaneçam para os que vestem a farda para defender a honra nacional.”
Lamentavelmente seu projeto, ainda na fase imperial, somente foi obedecido mais de vinte anos mais tarde, após a famosa “Revolta da Chibata”.


Meu caro bisavô,
Após sua morte os mais ilustres brasileiros lhe prestaram homenagens. Dentre as múltiplas delas, uma das mais expressivas é a que o grande homem público, o baiano Ruy Barbosa, pronunciou em 15 de junho de 1909, em sessão solene do Senado Federal, referindo-se ao senhor: “...Se o serviço público tem os seus mártires, nunca dessa experiência assistimos o mais singular exemplo.”

Meu querido bisavô,
Termino usando as mesmas belas palavras que o senhor utilizava no final das cartas aos seus diletos colegas de turma da Faculdade de Direito, no Largo de São Francisco – São Paulo:

“EX – CORDE”, ou seja “DE CORAÇÃO”, seu admirador e bisneto Affonso Augusto.

VIVA AFFONSO PENNA ! VIVA SANTA BÁRBARA ! VIVA MINAS GERAIS ! VIVA O BRASIL !